Social Icons

18 abril, 2011

Gratuidade das Aves e dos Lírios

Não costumo postar poemas alheios, mas Manoel de Barros e seus encantamentos me obrigam a divulgar aqui a doçura e simplicidade de suas palavras.
Há pouco tempo descobri uma coluna na rádio Band News, chamada "Devaneio". São poemas de poetas consagrados, como Cora Coralina, Carlos Drummond, Florbela Espanca e o poeta do Pantanal: Manoel de Barros, todos os poemas na voz do grandioso Juca de Oliveira.
Ouvir esses poemas na voz do Juca é como fazer cócegas diárias nos ouvidos. Quando tem Manoel de Barros, ouço mais de cinco vezes...Ontem ouvi "Gratuidade das Aves e dos Lírios", poema abaixo. Para quem gosta de sentir o poema roçar nos ouvidos, fica o link.

Ouça e leia, leia e ouça, ouça e chore, chore e sorria, leia e suspire...ah...aprecie!

Sempre que as gratuidades pousam em minhas
palavras,
elas são abençoadas por pássaros e por lírios.
Os pássaros conduzem o homem para o azul,
para as
águas, para as árvores e para o amor.
Ser escolhido por um pássaro para ser a árvore
dele:
eis o orgulho de uma árvore.
Ser ferido de silêncio pelo vôo dos pássaros:
eis o esplendor do silêncio.
Ser escolhido pelas garças para ser o rio delas:
eis a vaidade dos rios.
Por outro lado, o orgulho dos brejos é o de
serem escolhidos
por lírios que lhes entregarão a inocência.
(Sei entrementes que a ciência faz cópia de
ovelhas
Que a ciência produz seres em vidros
Louvo a ciência por seus benefícios à
humanidade
Mas não concordo que a ciência não se
aplique em
produzir encantamentos.)
Por quê não medir, por exemplo, a extensão
do
exílio das cigarras ?
Por quê não medir a relação de amor que os
pássaros
têm com as brisas da manhã ?
Por quê não medir a amorosa penetração das
chuvas
no dentro da terra?
Eu queria aprofundar o que não sei, como
fazem os
cientistas, mas só na área dos encantamentos.
Queria que um ferrolho fechasse o meu
silêncio, para
eu sentir melhor as coisas increadas.
Queria poder ouvir as conchas quando elas se
desprendem da existência.
Queria descobrir por quê os pássaros
escolhem
a amplidão para viver enquanto os homens
escolhem
ficar encerrados em suas paredes ?
Sou leso em tratagem com máquina; mas
inventei,
para meu gasto, um Aferidor de
Encantamentos.
Queria medir os encantos que existem nas
coisas sem
importância.
Eu descobri que o sol, o mar, as árvores e os
arrebóis
são mais enriquecidos pelos pássaros do que
pelos
homens.
Eu descobri, com o meu Aferidor de
Encantamentos, que
as violetas e as rosas e as acácias são mais
filiadas dos
pássaros do que dos cientistas.
Porque eu entendo, desde a minha pobre
percepção, que
o vencedor, no fim das contas, é aquele que
atinge
o inútil dos pássaros e dos lírios do campo.
Ah, que estas palavras gratuitas possam agora
servir
de abrigo para todos os pássaros do Brasil!

Manoel de Barros
Campo Grande, 27 de outubro de 1999

____________________________________



Acompanhe sempre a coluna Devaneios para ouvir Outros Poemas do Manoel e de outros poetas na voz do Juca.

17 abril, 2011

Luar

Lua Cheia
Olhos brilhantes
Claros
Castanhos
Divinos
Lua cheia
Vivo olhar
Luar.

Luar é a mistura da lua cheia com teu olhar
Desperta em mim toda a paixão
Toda a ternura
Toda a vontade de abraçar.

Quando avistar a lua cheia
lembrarei
que há uma união que a torna mais bela
A Lua,
Teus olhos...
Luar!

26 março, 2011

Emoções e descobertas em Rodas de Conversa

Há quase três meses lecionando no CEU Vila Rubi já vivi muitas emoções com minhas três turmas de sexto ano. E com esse mix de emoções afirmo: a leitura mexe com a emoção das pessoas, a leitura transforma, há coisas que um livro pode fazer na vida de uma pessoa que não sou capaz de descrever aqui.
Tenho como método solicitar leituras aos alunos e um diário de leitura registrando o envolvimento deles com o livro, peço que escrevam nesse diário como foi o encontro deles com o livro, o que o levou a lê-lo, os sentimentos despertados, o que conseguiram aprender. O registro do diário de leitura vai além do resumo sobre o enredo do livro. Meu aluno tem que produzir teu pensamento no diário, o que leva essa tarefa a ser carregada de emoção e envolvimento do aluno com o livro.
Na primeira semana de aula expliquei-lhes que leriam livros e escreveriam sobre essas leituras no diário de leitura, e como sou uma doida por livros, fui deixando bem claro para eles que essa seria uma tarefa de dentro, uma conversa do leitor com o livro. Fui deixando bem claro para eles também que sou uma pessoa que lê e gosta muito do que faz. Acho que perceberam isso e foram contagiados, porque no dia marcado para a entrega do diário e da nossa Roda de Conversa sobre as leituras feitas, me surpreendi tanto, que a emoção é difícil de descrever.

A nossa tímida Roda de Conversa sobre as leituras depois virou festa
 Meus alunos possuem um repertório literário que achei lindo e digno de condecorações. As leituras foram desde Chapeuzinho Vermelho a Marley e Eu. O melhor ainda é que cada um contou seu envolvimento com o livro, leram livros que ganham da Prefeitura para comporem suas bibliotecas, leram livros emprestados pela Biblioteca do CEU e pela Sala de Leitura, leram livros que tinham em casa, livros que pediram para os pais comprarem. Poucos do sexto ano ficaram sem ler, até quem chegou por último na turma (matrícula suplementar) queria ler e falar sobre um livro.
Essa experiência de falar para o outro, de ser ouvido, de falar de algo que viveu, de uma descoberta, deixou-os a princípio, aflitos, mas depois todos se soltaram, teve gente que não queria mais parar de falar. Na roda de leitura tive reencontros com muitos livros que li na minha adolescência, foi um reencontro maravilhoso, meus livros prediletos estavam lá nas mãos deles, e comecei a me sentir parte daquela história que eles estavam contando. O meu pé de Laranja Lima, O Pequeno Príncipe, Beleza Negra, livros da coleção Salve-se quem puder e muitos outros que li e gosto estavam ali na roda de conversa. Para mim, aquela roda foi só risos, emoções e descobertas.
Sim, aprendi muito com meus alunos, trouxeram-me sugestões de livros que pretendo ler com certeza. Já comecei ontem com o livro da Clarice Lispector sugerido por alguns alunos A vida íntima de Laura, li e gostei muito. Nessa roda de leitura descobri que ainda tenho muito o que ler.
Não lembrava que a Clarice escrevia para crianças. Ótimo livro para falar do tema diversidade
É tão bom quando a gente fala a mesma língua, e é tão bom quando acontece essa troca com uma turma, melhor ainda quando a troca e com três, quatro turmas. Estou muito feliz com esse presente: alunos apaixonados por livros. Causadores de emoções e descobertas. Já vi que o ano promete. Quero fazer nosso próximo encontro lá na Biblioteca do CEU.

17 março, 2011

Mais uma dose de Lygia Bojunga

Mês de Março começou muito bem para minha vida de leitora. Comprei dois livros. Um deles é da Lygia Bojunga, o outro é de Milan Kundera, autor que ainda desconheço, mas despertei interesse pelo livro numa conversa que tive outro dia com um professor de Artes lá do CEU.
Encomendei os dois livros pelo site da Livraria Cultura no mesmo dia. O livro do Milan chegou primeiro, mas não chamou muito minha atenção, e como estava com a capa um pouco amassada por causa da chuva, coloquei-o em cima da teve sobre outros e livros e lá está ele até hoje.
Já o livro da Lygia foi mais um caso de paixão ao primeiro contato. Quando entregaram o livro, eu não estava em casa, deixaram na casa da vizinha. Somente depois das 23h30 é que fui saber que ele me esperava lá. Fui buscá-lo embaixo de chuva e foi quando abri a caixa que o encantamento aconteceu. "LIVRO - um encontro" : esse foi o livro que encomendei. Quando tirei-o da caixa, fiquei encostada na pia, segurando-o, passando a mão na capa e olhando para a foto da Lygia, fazendo a mesma coisa que eu fazia naquele instante, admirando um livro.

Não sei quanto tempo fiquei nessa contemplação. Mas logo despertou em mim a vontade de ler depressa aquele livro, mas antes  de terminar a página 27, a vontade de escrever atropelou tudo. Abri o livro, peguei a caneta e desatei a conversar com o livro:
"Lygia, essa página aqui é meu canal de comunicação contigo. São 23h50 do dia 02 de março de 2011.É verão chuvoso (quase outono), acabei de receber teu livro. Digo melhor: acabei de ter o primeiro encontro de verdade com este livro. Terminei Querida no domingo e aguardei ansiosa por esse encontro aqui. Achei esse livro tão magrinho,  mas logo que abri, fui me ligando que esse aqui é um caso de amor teu com o LIVRO. Já me identifiquei, tanto que disparou dentro de mim a vontade de escrever, tão logo cheguei na página 27. Lembrei muito do meu encontro contigo, acontecimento de 2009. Logo já imaginei nós duas sentadas no banquinho do 'retiro' falando da 'nossa gente' que habita nos 15 livros já lidos. Encontro maravilhoso. Estou com tanto sono, vou deixar para continuar a ler depois, não fique triste, volto logo. Já entendi porque esse livro é bem magrinho: é uma história de amor não inventada, com livro e toda emoção que couber nas palavras. Cada página equivale à emoção de 10. /91x10=910 páginas.           P.S. Fiquei um bom tempo viajando com tua foto na capa. Divina."
 A leitura do  encontro da Lygia com o LIVRO provocou em mim muitas sensações. Muito diferente das sensações experimentadas nos outros livros. É como se nos fizéssemos companhia. E é uma companhia muito boa. Senti-me tão à vontade com as memórias dela, identifiquei-me tanto com teus casos. E pensar que meu encontro com a Lygia aconteceu há quase dois anos de forma tão inesperada! Só agora lendo o encontro dela com o LIVRO, muita coisa faz sentido pra mim. Passei o Carnaval na companhia da Lygia. Melhor Carnaval é mergulhado em Livro.
Quando a Lygia fala do encontro dela com a escrita, lembrei da vontade que tenho de retomar meu encontro com a escrita lá da adolescência. Sabe como??? Resgatando meu caderninho lá do quartinho de bagunças da minha avó (que mora na Bahia), temo que não esteja mais lá, até liguei ontem para investigar o paradeiro desse caderninho, mas não consegui falar com Vovó.
Incrível como a leitura dos livros da Lygia sempre soam como conversa. Resultado disso foi o livro todo conversado, com anotações lápis, parecia até um kit inseparável: o livro, meus olhos, minha mão e o lápis.
Durante a leitura, fiquei encucada com uma coisa: a Lygia conta de suas paixões pelos livros e autores, mas tem um que ela prefere não citar o nome, dando apenas as características do seu estilo, o que me deixou um tanto curiosa para descobrir o nome do santo. Pelo milagre, imagino que seja um autor que já fui muito apaixonada também, mas não vou arriscar palpite antes de investigar, quando descobrir, posto minhas conclusões. Mas estou louca para saber quem é o autor que a Lygia lia que escrevia livros por "receitas".
Quando terminei o livro, fiquei ainda a escrever nas páginas em branco que me restavam. Registrei o restante de nossa conversa:
É Lygia! Falta apenas ler "Fazendo Ana Paz" para completar a trilogia (Paisagem, Livro-um encontro e Fazendo Ana Paz). Fico pensando, qual será a sensação que terei quando terminar essa trilogia. Nesse momento, senti imensa vontade de reler "Paisagem", cheguei a sonhar com aquele livro. Imagine só? Juntar os três em uma única publicação? Vou relê-los juntos, com lápis nas mãos e sorriso na cara! Você é demais Lygia!    Esse teu jeito particular de entrelaçar as histórias me prenderam à tua escrita. Cada livro que leio, quando chego à última página, já está causado em mim o desejo de ler o próximo livro, de reler esse que terminei. Teus livros se casam tão bem, que a sensação logo é de conversa. É isso que penso, Lygia, tua escrita é uma conversa que não termina, e que o leitor não se cansa jamais de ter contigo. A cada leitura, imagino-me sentada num dos cenários de tua obra falando contigo. Espero que lendo todos os teus livros, nosso assunto não chegue ao fim.                 Sua leitora mais apaixonada, Jaque Flowers.          Ainda Verão, 2011.

16 março, 2011

Inspiração

Ontem escrevi que minha inspiração havia desaparecido, preocupada, produzi o mais solitário dos monólogos tentando encontrar uma solução pra essa falta de assunto.
A caminho do trabalho, na Avenida Interlagos, em uma das super-lotações de São Paulo, observava a cidade e o que ia ficando para trás à medida que a lotação avançava. Deparei-me com uma cena emocionante e ao mesmo tempo curiosa: acima de um prédio, bem ali no meio do caos e trânsito do meio dia estava acontecendo uma manifestação de passarinhos.
Na hora estalei os olhos e vidrei naquela cena. Eram mais de cem pássaros formando uma cena ímpar, o que posso descrever como revoada. Todos eles voavam acima daquele prédio (não havia árvores por perto), em pequenos círculos, indo para lá e para cá, como se estivessem fazendo uma revolução ou protestando por alguma causa.
Fiquei curiosa, desejei parar, desejei ter a câmera nas mãos para registrar o momento. mas não foi possível, apenas meus olhos testemunharam aquela cena, que logo trouxeram minha inspiração de volta. Penso que aqueles pássaros queriam ser vistos, talvez protestassem por uma árvore, por um lar verde e digno, talvez protestassem por uma flor. Talvez protestassem para que eu voltasse a escrever.
Aqueles pássaros mostraram-me que minha inspiração não havia partido, simplesmente falta disciplina e tempo para registrar esses pequenos momentos do meu dia.
Em pouco mais de dois meses fazendo esse caminho para o CEU Vila Rubi, meus olhos já testemunharam tantos eventos que não caberiam nessa postagem.
A inspiração não foge, a gente é que não está preparado para registrar as inspirações diárias, principalmente aquelas proporcionadas pela natureza. Uma coisa é certa: minha câmera precisa sair de casa. Ainda bem que me restaram as palavras.

15 março, 2011

Tá sobrando espaço

- Alô, Doutor? Tô ligando pra dizer que tô sofrendo mal de amor. Mal não, porque tá fazendo um bem danado. Mas é que de vez em quando dói, sabe? Não sei como a medicina nomeia esses sintomas, o fato é que as vezes dói. Dói lá no fundo da alma. Uma falta tão grande que fica sobrando espaço aqui dentro do peito. Ao mesmo tempo em que não há mais espaço pra nada. Também ando sem ânimo, Doutor. Sem ânimo pra tudo, com ânimo pra nada. Tá sobrando suspiro e faltando inspiração. Mas não vá pensando que é suspiro de padaria, que esse aí não sobra um, como todos de tanta ansiedade. Deve ser por isso que minhas calças não querem mais abotoar direito, e minhas blusas parecem que são de quando eu tinha treze anos. Ah, Doutor, passa um remédio aí, não sei o que faço pra ter de volta minha inspiração e continuar com esse mal de amor que tá fazendo um bem danado.
Não sei porque, mas me inspiro mais na dor. E agora tô sofrendo com a ausência da minha inspiração. Mas vou logo avisando, não quero dor! Não quero dor!